Friday, March 24, 2006

VINHO

Um dia frio, apesar de ensolarado. Bom para planejar encontros de final de tarde em algum lugar envidraçado e com lareira. De preferência com vista para o pôr-do-sol.
Com esses pensamentos, Maurício caminha pela Rambla, em Barcelona. Está ali por causa de um Congresso sobre petróleo. Muito papo de americanos e sauditas em torno de cotas e preços. Para ele tudo soa como “papo furado”, pois a Petrobrás, que o havia enviado ali, acabaria fazendo o que os americanos decidissem. O melhor era ir caminhar, conversar com alguém, tomar um vinho. Numa esquina que se abre para o mar encontra um bar (ou restaurante?) que se assemelha com o que vinha idealizando. Coincidência? Coisas do Destino? Bah! Não acreditava muito nessas coisas, o que tinha de fazer era tratar de aproveitar a oportunidade.
Era um cara de sorte, pensou. Uma mesa, ao lado de uma grande janela envidraçada, próxima a uma estufa a gás, convidava a sentar, mas uma mulher ocupava um dos lugares. De meia-idade, olhar sereno e gestos calmos, parecia ser simpática. Resolveu arriscar. Aproximou-se, fez o melhor sorriso que tinha e perguntou se poderia sentar. A mulher ficou surpresa, fez cara de espanto, mas contagiada pelo sorriso, ou porque estava de bem com a vida, disse que sim. Apresentações: ele turista brasileiro; ela madrilenha, professora de matemática numa escola secundária de Barcelona.
O que conversariam pensava Maurício quando, para sua surpresa, ela pergunta se conhecia os vinhos espanhóis. A princípio pensou em dizer sim, mas olhando para aquela mulher simples, mas com uma elegância de gestos e uma firmeza no olhar, resolveu dizer que não. Afinal sempre poderia aprender alguma coisa!
Absorto naquela atmosfera de encanto, como havia pensando enquanto caminhava pela Rambla, deixou-se levar pela voz suave e firme de Sarita (assim se chamava aquela espanhola não muito bonita, mas encantadora), que falava sobre os diversos vinhedos do país. Por momentos imaginava que estava ali com Laura, que era ele quem “ensinava” sobre vinhos e que ela, olhos bem abertos de admiração, absorvia cada palavra dele como quem toma, gole a gole, um cabernet de boa safra. Por fim consegue se concentrar no exato momento em que Sarita sugere um “Marquês de Riscal” dos vinhedos de Rioja. “Crianza” ou “Reserva”? Diz ela. Reserva, pensa ele, deve ser coisa melhor, então, com cara de conhecedor, diz: Reserva. Ela move a cabeça como sinal de aprovação e sorri para Maurício. Começava, assim, uma amizade que duraria muitos anos.

Nei Guimarães Machado
Oficina de Criação Literária
Dezembro de 2003.

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