Saturday, March 25, 2006

ADOLESCÊNCIA*
Prof. Dr. Nei Guimarães Machado**


Embora haja consenso entre vários autores ao definir a adolescência como um período de transição entre a infância e a idade adulta, não há definição precisa sobre os limites deste período de vida.
Em 1977, especialistas da OMS, estabeleceram como limites da adolescência as idades entre 10 e 20 anos, para fins de padronização, já que a maioria dos jovens em processo de adolescer encontra-se nesse período.
A palavra adolescer vem do latim e significa crescer, tornar-se maior, atingir a maioridade. A conceituação sobre adolescência recomendada pelo Seminário Latino Americano sobre Saúde do Adolescente, realizado em outubro de 1977, diz:

“Adolescente é o indivíduo que se encontra em fase peculiar
de transição biopsicossocial, período este caracterizado por
transformações biológicas em busca de uma definição de seu
papel social, determinado pêlos padrões culturais de seu meio”.

Basicamente a adolescência envolve três vertentes conjugadas, o componente biológico, o sociocultural e o psicológico.


FATORES BIOLÓGICOS

Ao conjunto das transformações físicas que ocorrem na adolescência chama-se puberdade. A maturação normal depende do desenvolvimento, funcionamento e integração de um sistema glandular complexo, que envolve o hipotálamo, a hipófise, as gônadas e supra renal. Somente após a menarca (primeira menstruação), que geralmente se dá ao redor dos doze anos de idade, e após a primeira ejaculação, perto dos treze anos de idade, é que se estabelece integralmente a adolescência.
As alterações mais marcantes da puberdade feminina iniciam-se pela telarca (desenvolvimento das mamas). Ao mesmo tempo a distribuição da gordura passa a seguir o padrão feminino e inicia-se a pubarca (crescimento de pêlos púbicos e axilares). Por essa época ocorre um rápido e acentuado crescimento da estatura (estirão), que atinge o máximo, em média, aos 11,7 anos de idade. A menarca ocorre ao final desse estirão. Essas mudanças são regidas pelo estrogênio e a progesterona.
Nos meninos, inicialmente, há o desenvolvimento dos testículos e escroto. Quase concomitantemente ao crescimento dos pêlos púbicos e axilares ocorre o estirão, que atinge a velocidade máxima de incremento, em média, aos 13,7 anos, portanto mais tardio do que nas meninas. No final do estirão ocorre o aumento do pênis.
Além dessas modificações de ordem sexual, observa-se a melhora das habilidades motoras, para as quais a coordenação, agilidade e velocidade são necessárias, sendo o limite de desenvolvimento a idade dos quatorze anos. A partir daí não se observam mudanças físicas significativas para ambos os sexos, a não ser no que diz respeito à voz e crescimento estatural para os homens, este último concluído aos 21 anos, aproximadamente.


FATORES SÓCIO-CULTURAIS

Há sociedades em que a transição entre criança, adolescente e adulto é um fenômeno natural e contínuo, que não provoca desafios ao ser humano. Trata-se, portanto, de um condicionamento cultural contínuo. Para ilustrar essa visão vale citar o simbolismo que ocorre entre os índios Cheyenne. Ao nascer, o pequeno índio ganha um pequeno arco, que vai sendo trocado por maiores à medida que ele cresce. O mais velho o ensina a caçar, numa seqüência lógica, iniciando pelas caças que são facilmente apanhadas. A família participa desse aprendizado, festejando cada conquista como um grande acontecimento, tendo a mesma importância do que a caça de, por exemplo, um búfalo, conseguida por seu pai. Quando finalmente cresce e consegue ele mesmo abater um búfalo, nada mais fez do que concluir um condicionamento que se iniciou na infância, não representado um novo papel assumido na comunidade.
Por outro lado, o condicionamento cultural descontínuo impõe verdadeiras barreiras sociais para se atingir a condição de adulto. Em algumas sociedades os chamados “ritos da puberdade” são cerimônias de iniciação para a vida adulta. Em alguns povos aborígenes da Austrália, os iniciados são colocados em “túmulos”, ou cobertos com galhos de árvore, fingindo-se de mortos. Durante essa iniciação os familiares permanecem de luto, como se o iniciado tivesse morrido mesmo e ao despertar vá para a nova vida de adulto.
Muitos desses “rituais de passagem” incluem torturas físicas, perfurações de orelhas, nariz, etc. Na África, entre os Masai, a iniciação começa pela circuncisão nos meninos e a clitoridectomia nas jovens. No Brasil, entre os índios Tupinambás, os “ritos da puberdade” atingem apenas a menina e inicia-se com a menarca. Ela é, então, obrigada a jejuar por três dias consecutivos, têm seus cabelos raspados, suas costas cortadas e nelas colocadas cinza para que fique marcada para sempre.
Vale ressaltar que, em muitas dessas culturas, a passagem da infância para a vida adulta ocorre sem que se identifique uma fase de transição.
Pode-se observar, ainda, que numa mesma cultura, o determinante da adolescência é a classe social a que pertence o indivíduo, com comportamentos próprios correspondentes àquele nível sócio-econômico. De modo geral a sociedade ocidental considera o jovem como representante de um grande mercado consumidor. Nas classes sociais mais pobres o jovem representa apenas um bom segmento de força bruta de trabalho, sem condições adequadas de se desenvolver, integralmente, como ser humano.


FATORES PSICOLÓGICOS

O campo que estuda a psicologia da adolescência é vasto e repleto de controvérsias. Ele baseia-se na interação da pessoa com o meio ambiente.
Segundo Knobel, as características principais do adolescente são a busca do eu próprio, tendência a se instalar em grupos, necessidade de fantasiar e intelectualizar, crises de religiosidade, falta de conceito do tempo (imediatismo), busca de atividades sexuais, comportamento reivindicatório, condutas contraditórias, independência progressiva dos pais, flutuações de humor e estado de ânimo. São ainda aspectos marcantes da adolescência a insatisfação, a insegurança e a agressividade.
Provavelmente, o ponto central da adolescência gravita em torno da busca do eu próprio, ou seja, a busca da identidade. Muitos autores concordam com essa perspectiva, acreditando que a gênese da elaboração da identidade adulta comece já na primeira infância.
No desenvolvimento da identidade há um fator muito importante que é a informação. Este é um processo de comunicação que integra os aspectos afetivo e intelectual entre a criança e o seu ambiente familiar e social. Desta forma torna-se evidente que o desenvolvimento psicossocial depende bastante dos pais. A escola é outro agente social de grande relevância no processo de formação da identidade própria. Ela representa o primeiro contato do jovem com pessoas que, além dos pais, também representam a autoridade.
Na construção da identidade pessoal há também que se considerarem os grupos de parceria, isto é, as pessoas significativas para o adolescente, que geralmente são os companheiros (“turma”), que passam a influenciar o comportamento do adolescente, muitas vezes até mais do que os próprios pais e professores. No grupo, o jovem vai construindo o seu próprio eu, buscando a aprovação, a admiração e o respeito dos outros companheiros.
Como se depreende dessas idéias, a maturidade psicológica é reflexo da integração do próprio ser (incluindo aqui o biológico) com o seu meio ambiente (aspectos socioculturais).
Portanto essa integração biopsicossocial é um período delicado da existência humana. O adolescente sente-se inseguro pois já não é mais criança e tampouco adulto tendo dificuldades em se definir nas diversas situações de sua cultura.
A tentativa de ultrapassar a insegurança e de se auto-afirmar pode levar à transgressão, à busca do prazer imediato, às atitudes desafiadoras e ao uso de drogas que aparentemente aliviam todas as insatisfações que sobrevêm durante a adolescência.

*Material compilado e organizado para servir de introdução à Disciplina de “Psicologia do Desenvolvimento” do Curso de Especialização em Psicoterapia Breve-Focal do Instituto Sándor Ferenczi.

** Diretor Administrativo e Professor do “Curso de Especialização em Psicoterapia Breve-Focal” do Instituto Sándor Ferenczi; Pelotas – RS – Brasil.
Professor de “Sistema Teórico Psicanalítico” na Escola de Psicologia da UCPEL.
Médico Psiquiatra responsável pelo “Ambulatório de Transtornos Afetivos na Terceira Idade” do CETRES/UCPEL.

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